23 June 2016

Dags & Dogs


Sempre tive dificuldade em compreender a frase "Quanto mais conheço as pessoas, mais gosto do meu cão.". Acho que só se justifica quando se teve o azar de ter uma família completamente disfuncional, muita falta de amor, muitos problemas sociais. Sim, os cães e o gatos e os coelhinhos e os periquitos são giros e engraçados mas, calma, estão muito longe de poder ser comparados a pessoas. Cada vez mais há uma tendência para as pessoas se agarrarem emocionalmente aos seus animais de estimação de uma forma quase obsessiva e que a mim me parece pouco saudável. Que se estime os animais, muito bem. Que se lhes dê carinho, atenção, cuidados, ótimo. Mas, calma... 
 
Julgo que somos cada vez mais solitários e tentamos colmatar as nossas deficiências de atenção e carinho interpessoal pela parca troca de emoções possível com animais. E sim, é verdade que eles estão sempre lá. Dás-lhe uma sapatada e o canito, coitadinho, volta para a tua beira sem te pedir nada em troca. Fácil. As pessoas exigem um bocado mais... não te dão muito e pedem tanto! São complexas, têm humores, têm opiniões, têm dias maus, precisam que lhes oiças... são chatas, difíceis.
 
Eu gosto de pessoas e das suas complicações e exigências. Adoro crianças, as minhas e a dos outros. Adoro o barulho das gargalhadas, dos gritos, das birras, das conversas, das discussões. Adoro observar rostos, expressões. Adoro pessoas.
 
Há uns dias almocei com uma mulher que, em meia dúzia de frases, representou tudo aquilo que cada vez mais observo e menos me custa a entender.
 
- A minha irmã ainda está de férias... Estou cheia de saudades... - Desabafou ela.
- Ah... pois, vocês vivem juntas, não é? É normal que sintas falta dela. - Disse eu.
- Sim, vivemos, mas estava a falar dos meus cães. Eles foram com ela.
 
Minutos depois, diz ela:
 
- Eu vou sempre de férias na segunda quinzena de Setembro. Os putos já estão todos na escola e não tenho de os aturar.
 
Calei-me. Tenho de respeitar esta forma de pensar. Tenho de aceitar que há pessoas que amam mais os cães do que os irmãos, que preferem o som do ladrar de um cão ao som da gargalhada de uma criança. No fundo, sinto alguma pena, confesso. Julgo que nestes casos, há muita falta de amor, de toque, de calor humano. E não digo isto achando que, por ter filhos, sou mais do que os outros. Sempre pensei assim, mesmo antes de ser mãe. Lembro-me de ir para a praia e gostar de ficar ao pé dos miúdos das colónias de férias porque gostava e gosto de os ver e ouvir.

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Bom, depois de escrever isto, vi a Crónica Criminal do programa da manhã da TVI e, caros leitores, digo-vos uma coisa, quanto mais conheço as pessoas, mais eu gosto do meu cão.

 

30 March 2016

Invasão de Privacidade

Mudei de casa há 3 meses. E se, dantes, a minha vista era para mato, coelhos e cabrinhas, agora é, de um lado, para a cidade de Lisboa, e do outro para os prédios do outro lado da estrada. Por motivos de força maior, passo algum tempo à janela da cozinha que dá precisamente para os tais prédios. E eis que me deparei com uma nova situação: a invasão da privacidade. Não é a invasão de privacidade, que acontece quando nos invadem a nossa privacidade. Não. É a privacidade dos outros que me invade, entra-me pelos olhos adentro, desavergonhada e sem pedir licença.

Já vi de tudo um pouco. Até já aprendi umas coisas. Descobri, por exemplo, que as donas de casa têm o hábito de pôr as almofadas a arejar, entalando-as na janela... Nunca tinha pensado em tal coisa. Há uma senhora, aliás, que, ao acordar, se despe toda (mesmo toda) em frente à janela e atira com o pijama para o parapeito da janela, julgo que também para o arejar, ou se calhar é uma questão de aproveitamento de espaço. Não sei.

E há um indivíduo... Ó céus, um indivíduo... O indivíduo que me fez pensar nesta coisa da invasão da privacidade... O indivíduo que me invade os olhos. Pois, o indivíduo chega a casa e vai para a cozinha que dá para a janela da minha cozinha. Ele abre a janela, deixa-a bem escancarada, e despe-se. Despe-se todo. Conforme se despe, vai cheirando as diferentes peças de roupa... e depois, às vezes, veste-se. Outras vezes, não. Fica só de cuequita... Vai-se a ver e tem calor, que isto tem estado com temperaturas muito altas ultimamente...

E podia ser uma imagem deste género:



E, se assim fosse, minhas amigas, eu até não me importava assim tanto e ficava aqui caladinha a deixar a invasão acontecer.

Mas não é nada disto. É mais isto:



E o indivíduo senta-se numa mesinha que tem na cozinha e lá fica todo o serão. E parece um macaco... faz coisas nojentas que não vou descrever. É porco e mete-me nojo. E parece ter algum gosto em ser visto. Faz questão de deixar a janela sempre aberta e senta-se mesmo em frente a ela.

Eu não quero olhar, fico de lado, olho para o céu, olho para baixo, fecho os olhos... mas a privacidade dele invade-me. E ele está em sua casa, faz o que quer. Quem sou eu para me queixar? Não gostas, não olhas. Só que não é assim tão fácil... E tenho saudades da minha varanda e dos meus coelhinhos.

Mas vá, na dificuldade devemos encontrar a oportunidade: talvez tenha agora a grande motivação para largar o vício de uma vez por todas. Fumar passou a ser uma tortura visual.